terça-feira, 20 de novembro de 2007

pulga, formiga e piolho ou U.S.S., 17, morreu...

gente, como estrela, tem luz própria
deveria nascer iluminada e brilhar a vida toda
e não falo só daquela gente que já nasce
com quartinho desinfetado, azul ou rosa
repleto de bichinhos de pelúcia
falo de toda gente...

criança, como gente, tem vida
como bicho e como planta
pedras não têm vida
criança deveria ter infância
e não falo só da criança solidária
que doa o seu brinquedo velho
porque ganhou mais dez novinhos em folha
falo de toda criança...

pulga, formiga e piolho
nasceram gente e crianças
mas a rua os batizou como insetos
e insetos, tirando o vaga-lume,
não têm luz própria, só luz de gato
mas não têm sete vidas, só uma
e nem insetos são pedras...

amigos, como gente e insetos, convivem
inimigos não convivem
diz a rua que inimigo a gente mata
com qualquer coisa que se tenha a mão
até com pedra
alguns insetos são inimigos
ou a gente mata, ou matam a gente
na rua convivem gente, pedras e insetos...

pulga, formiga e piolho foram amigos
amigos inseparavelmente unidos
insetos, pedras e plantas não têm amigos
só gente tem esta capacidade
o que um fazia, os outros copiavam
o que um sentia, os outros queriam para si
amigos agem assim, amigo tem luz própria...

pulga foi o primeiro
a dar uma tragada
a pegar carona em rabeira de ônibus
a matar um gato a pedrada
a dormir na praça da marinha
a descolar uma grana em semáforo...

formiga foi o primeiro
a cheirar cola
a cheirar coca
a tomar pinga
a transar
a esfaquear gente...

piolho foi o primeiro
a dirigir um carro roubado
a conseguir um tresoitão
a conhecer um estabelecimento para
reeducação de menores transviados
a matar gente a tiro...

a vida é uma grande e maravilhosa aventura
pulga, formiga e piolho viviam juntos
não foram pedras, nem insetos, nem plantas
mas é difícil acreditar que foram gente
gente, como estrela, tem luz própria
deveria nascer iluminada e brilhar a vida toda...

pulga, formiga e piolho estão separados
formiga puxa cana no presídio estadual
do paradeiro de pulga ninguém sabe
piolho já não existe mais
a mãe do piolho o batizou como Ueslley
fez questão dos dois eles e do ípsilon do final
nome estrangeiro para se dar bem na vida
o esse esse era do Silva e Santos
sobrenome de pai e mãe, como na realeza...

Ueslley virou piolho
assim como Welington e Roberto Carlos
viraram pulga e formiga
de estrela, Ueslley só teve um dia
aquele em que suas iniciais saíram no jornal:
U.S.S., 17, foi morto...

(Carlos Luz)

6 comentários:

Super Elo disse...

Nossa Carlos
Parabéns
to encantada com a poesia
acho fascinante quando leio o título e penso: oq q é isso?
as respostas no texto estão claras, e chocam pela forma como foram escritas
parabéns mesmo, poesia muito bonita
merecia o primeirão
:)

toniandre disse...

Muito bom! É quase uma prosa poética, bem ao estilo do João cabral! Não achas?
Também vejo um trabalho que mescla a poética com o jornalismo, bem adequado e Drummnondiano.
Parabéns

Anônimo disse...

brilhante.

Paula disse...

Oi Carlao, parabens! nos aqui de Roma, Italia, lemos todos juntos o teu poema. Achei muito original a maneira com a qual voce escreveu pois deixa sempre uma curiosidade na pessoa e a gente se sente obligado a ler ate o final. A mensagem è muito bonita apesar da realidade ser tao crua.
Nao desperdice este teu talento, rapaz!
Un abbbraccio grande dal gruppo italiano di Ore undici.

Anônimo disse...

Estou sem palavras, Carlão!
parabéns pela forma brilhante e ao mesmo tempo provida de sensibilidade que consegue emocionar e chocar ao mesmo tempo.

livia disse...

Oi Carlos, realmente impressionante, mas vindo de vc ñ é surpresa. Uma situação tão triste e tão grave e vc conseguiu passar de uma forma tão poética!!!
Ao ler a poesia conseguimos até visualizar os meninos e as situações.Confesso q me comovi e ao mesmo tempo me senti orgulhosa em ser sua amiga e poder compartilhar esse poema com vc!!!
O prêmio foi mais q merecido!!!
Sei q parabéns épouco!!! Mesmo assim... Parabéns meu super amigo!!!
um super beijo!!!