Educação inclusiva: onde ela começa?
Eliana Tão
Que Foz do Iguaçu é conhecida mundialmente pela geografia privilegiada e pelos atrativos turísticos, isso muitos sabem. Sociologicamente, a cidade também é merecedora de admiração, uma vez que acolhe, convive e respeita pessoas de diferentes origens étnicas.
Nesse sentido, acredito que cabe também à Terra das Cataratas uma detalhada análise sob o aspecto pedagógico, uma vez que trabalha diariamente a educação inclusiva.
Aqui abro um parêntese, pois não me refiro apenas a inclusão de alunos com necessidades especiais nas instituições de ensino regular, mas também à composição multicultural das salas de aula.
E eu posso falar do tema com propriedade inclusive sob os dois aspectos, pois sou chinesa nascida em São Paulo Capital, portadora de necessidades especiais em razão de um parto prematuro e iguaçuense de coração.
Em meus anos de estudante, quase todas as turmas que integrei tinham basicamente a seguinte composição de alunos: brasileiros, mulçumanos (meninas com apenas o rosto e as mãos expostas), chineses oriundos da China Continental e de Taiwan.
Estou relembrando tempos remotos da educação inclusiva, pois sou da geração Coca-Cola enquanto o Capítulo V que trata da educação especial na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional é de 20 de dezembro de 1996.
Ou seja, eu estava 14 anos a frente da Lei nº 9394/96, onde os dois primeiros parágrafos do Art. 58 dizem respectivamente que “haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender as peculiaridades da clientela de educação especial” e “o atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular”.
Ainda que com o apoio dos meus pais e médicos eu tenha conseguido ingressar no ensino regular não sofri algo que seja considerado bullying ou xenofobia por parte dos meus colegas, que em sua maioria se mostravam muito receptivos e solidários a ponto de alguns serem meus melhores amigos até os dias atuais.
Mas como não lembrar o episódio ocorrido quando eu tinha cinco anos de idade. A professora não me chamou para colocar o meu enfeite na árvore de Natal (e na sequência fazer meu pedido secreto) por considerar que eu não caminhava sem apoio e dava muito trabalho me levar.
A cada um dos alunos que ela chamava, perguntavam quando seria a minha vez e muitos se prontificavam em me ajudar. Ela dizia: “depois”. Mas a “educadora” acabou não me colocando na atividade até o fim do dia e transformou a resposta em um “nunca” disfarçado.
Mesmo assim, não adianta ficar preso, fugindo, se escondendo do mundo para evitar possíveis sofrimentos. Isso é uma ilusão, uma forma de adiar o acontecimento. Porque vai acontecer, um dia ou outro, mesmo quando descobrir que vai ter que sair da zona de conforto em busca de conhecimento. E não tem como proporcionar educação inclusiva para alguém que se exclui.
Então onde começa a educação inclusiva? Para o arquiteto Reinaldo Baeta – autor do desenho que ilustra esta crônica – começa cedo, na escola, para todas as pessoas.
A Convenção da Guatemala (1999), promulgada no Brasil pelo Decreto nº 3.956/2001, afirma que as pessoas com deficiência têm os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que as demais pessoas, definindo como discriminação com base na deficiência, toda diferenciação ou exclusão que possa impedir ou anular o exercício dos direitos humanos e de suas liberdades fundamentais.
Esse decreto tem importante repercussão na educação, exigindo uma reinterpretação da educação especial, compreendida no contexto da diferenciação adotada para promover a eliminação das barreiras que impedem o acesso à escolarização.
As instituições de ensino, por sua vez, são compostas por pessoas. Portanto, a educação inclusiva tem início em cada ser humano que tem sua formação desencadeada pela família, onde se “deve” transmitir valores como tolerância, respeito às diferenças, solidariedade, amizade incondicional.
Afinal, outra canção de Jay Vaquer traduz bem a condição daquele que é considerado o ser “mais evoluído” entre todos os seres vivos existentes, independente de ser ou não portador de necessidades especiais: “Eu não sei viver sem ter carinho, é a minha condição. Eu não sei viver triste sozinho, é a minha condição”.
Eliana Tao é jornalista em Foz do Iguaçu.
Ilustração: Reinaldo Baeta.
Nesse sentido, acredito que cabe também à Terra das Cataratas uma detalhada análise sob o aspecto pedagógico, uma vez que trabalha diariamente a educação inclusiva.
Aqui abro um parêntese, pois não me refiro apenas a inclusão de alunos com necessidades especiais nas instituições de ensino regular, mas também à composição multicultural das salas de aula.
E eu posso falar do tema com propriedade inclusive sob os dois aspectos, pois sou chinesa nascida em São Paulo Capital, portadora de necessidades especiais em razão de um parto prematuro e iguaçuense de coração.
Em meus anos de estudante, quase todas as turmas que integrei tinham basicamente a seguinte composição de alunos: brasileiros, mulçumanos (meninas com apenas o rosto e as mãos expostas), chineses oriundos da China Continental e de Taiwan.
Estou relembrando tempos remotos da educação inclusiva, pois sou da geração Coca-Cola enquanto o Capítulo V que trata da educação especial na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional é de 20 de dezembro de 1996.
Ou seja, eu estava 14 anos a frente da Lei nº 9394/96, onde os dois primeiros parágrafos do Art. 58 dizem respectivamente que “haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender as peculiaridades da clientela de educação especial” e “o atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular”.
Ainda que com o apoio dos meus pais e médicos eu tenha conseguido ingressar no ensino regular não sofri algo que seja considerado bullying ou xenofobia por parte dos meus colegas, que em sua maioria se mostravam muito receptivos e solidários a ponto de alguns serem meus melhores amigos até os dias atuais.
Mas como não lembrar o episódio ocorrido quando eu tinha cinco anos de idade. A professora não me chamou para colocar o meu enfeite na árvore de Natal (e na sequência fazer meu pedido secreto) por considerar que eu não caminhava sem apoio e dava muito trabalho me levar.
A cada um dos alunos que ela chamava, perguntavam quando seria a minha vez e muitos se prontificavam em me ajudar. Ela dizia: “depois”. Mas a “educadora” acabou não me colocando na atividade até o fim do dia e transformou a resposta em um “nunca” disfarçado.
Mesmo assim, não adianta ficar preso, fugindo, se escondendo do mundo para evitar possíveis sofrimentos. Isso é uma ilusão, uma forma de adiar o acontecimento. Porque vai acontecer, um dia ou outro, mesmo quando descobrir que vai ter que sair da zona de conforto em busca de conhecimento. E não tem como proporcionar educação inclusiva para alguém que se exclui.
Então onde começa a educação inclusiva? Para o arquiteto Reinaldo Baeta – autor do desenho que ilustra esta crônica – começa cedo, na escola, para todas as pessoas.
A Convenção da Guatemala (1999), promulgada no Brasil pelo Decreto nº 3.956/2001, afirma que as pessoas com deficiência têm os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que as demais pessoas, definindo como discriminação com base na deficiência, toda diferenciação ou exclusão que possa impedir ou anular o exercício dos direitos humanos e de suas liberdades fundamentais.
Esse decreto tem importante repercussão na educação, exigindo uma reinterpretação da educação especial, compreendida no contexto da diferenciação adotada para promover a eliminação das barreiras que impedem o acesso à escolarização.
As instituições de ensino, por sua vez, são compostas por pessoas. Portanto, a educação inclusiva tem início em cada ser humano que tem sua formação desencadeada pela família, onde se “deve” transmitir valores como tolerância, respeito às diferenças, solidariedade, amizade incondicional.
Afinal, outra canção de Jay Vaquer traduz bem a condição daquele que é considerado o ser “mais evoluído” entre todos os seres vivos existentes, independente de ser ou não portador de necessidades especiais: “Eu não sei viver sem ter carinho, é a minha condição. Eu não sei viver triste sozinho, é a minha condição”.
Eliana Tao é jornalista em Foz do Iguaçu.
Ilustração: Reinaldo Baeta.
Este artigo foi publicado originalmente no Portal Megafone – Rede Cidadania na Comunicação